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segunda-feira, 22 de abril de 2013

Vida do Beato Frederico Ozanam (1813-1853)

Frederico Ozanam nasceu a 23 de Abril de 1813, em Milão (Itália). Filho de Jean-Antoine, médico prestigioso, cuja fama profissional não o impedia de assistir doentes indigentes, com o mesmo cuidado e afabilidade reservados aos pacientes da alta condição social, e de Marie Ozanam, também dedicada à assistência dos pobres e enfermos. Frederico respira desde o nascimento o profundo espírito de caridade compartilhado pelos seus pais.
Depois de uma infância muito protegida em Lião, Frederico entra no colégio em 1822 para começar os estudos secundários. Estudante brilhante e leitor insaciável, aos 17 anos conhece várias línguas: grego, latim, italiano e alemão, e inicia um curso de hebraico e sânscrito. De espírito sensível e preocupado, é apaixonado pelo estudo da Filosofia, consumindo-se com frequência numa investigação existencial e espiritual, que jamais abandonará.
Em 1831, Frederico, erudito jovem de província, chega a Paris para estudar na Sorbona. Em pouco tempo converte-se num assíduo frequentador dos ambientes intelectuais (entre os quais o salão de Madame Récamier) e começa a colaborar com jornais e revistas. Apesar da sua timidez e do comportamento simples, emergem com clareza tanto a sua profunda humanidade como o seu rigor moral: a sua imensa cultura, as suas opiniões actualizadas e o seu catolicismo empenhado tornam-no rapidamente uma personalidade relevante. Frederico dedica a sua formidável eloquência a moderar os debates sobre religião e política, num círculo literário estudantil chamado «Conferência de história», do qual é porta-voz. Certa tarde, depois de sair vencedor de um debate com um estudante socialista sobre o compromisso social dos católicos, anuncia a um amigo a intenção de realizar finalmente um projecto, que há tempo lhe era muito querido: uma «Conferência de caridade», uma associação de beneficência para a assistência dos pobres, «a fim de pôr em prática o nosso catolicismo».
Desta maneira, em Maio de 1833, com apenas 20 anos, Frederico funda, juntamente com seis companheiros, as Conferências de São Vicente de Paulo: «na época borrascosa em que nos encontramos, escreve ao seu amigo Ferdinand Velay, é bonito assistir à formação, acima de todos os sistemas políticos e filosóficos, de um grupo compacto de homens decididos a usar todos os seus direitos como cidadãos, toda a sua influência, todos os seus estudos profissionais, para honrar o catolicismo em tempos de paz e defendê-lo em tempos de guerra». Nenhum dos seus jovens fundadores podia imaginar o desenvolvimento que alcançaria esta pequena Sociedade benéfica, à qual Frederico se dedicaria, daí por diante, sem jamais poupar esforços.
Doutor em Direito (1836) e depois em Letras (1839), Ozanam inicia uma brilhante carreira universitária que o levará, em 1844, a tornar-se o titular da cátedra de Literatura Estrangeira na Universidade da Sorbona e a viver sem reservas a sua profunda vocação ao magistério.
Em 1841 casa-se com a jovem Amélie Soulacroix. Frederico Ozanam é, portanto, um homem profundamente inserido no seu tempo. Marido e pai, professor e literato, leigo comprometido, vive as diferentes dimensões da sua existência, com a mesma paixão e generosidade: vai pessoalmente aos bairros pobres de Paris e de outras cidades, promove a expansão das Conferências vicentinas no mundo, publica escritos históricos e literários, luta pela liberdade civil, política e religiosa, sofrendo pelos contrastes que dividem o mundo católico em facções políticas opostas, e tendo um coração cheio de ternura para com Amélie e Marie, sua filha. O seu caminho espiritual, sempre atormentado, conhece altos e baixos: Frederico julga não fazer o suficiente, e pede ao Senhor que o ajude a ser melhor, luta contra o orgulho até se esquecer do próprio valor.

Homilia do Papa João Paulo II por Ocasião da Beatificação de Frederico Ozanam

XII JORNADA MUNDIAL DA JUVENTUDE
79ª VIAGEM APOSTÓLICA DE JOÃO PAULO II – PARIS
HOMILIA DO SANTO PADRE
DURANTE A MISSA DE BEATIFICAÇÃO
DE FREDERICO OZANAM
Catedral de Notre-Dame, 22 de Agosto de 1997
1. «O amor vem de Deus» (1 Jo 4, 7). O Evangelho deste dia apresenta-nos a figura do bom Samaritano. Mediante esta parábola, Cristo quer mostrar aos Seus ouvintes quem é o próximo citado no maior mandamento da Lei divina: «Amarás ao Senhor teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma, com todas as tuas forças e com todo o teu entendimento, e ao teu próximo como a ti mesmo» (Lc 10, 27). Um doutor da Lei perguntava o que devia fazer para ter parte na vida eterna; encontrara nestas palavras a resposta decisiva. Sabia que o amor de Deus e do próximo é o primeiro e o maior dos mandamentos. Apesar disso, pergunta: «Quem é o meu próximo?» (Lc 10, 29).
O facto de Jesus propor um Samaritano, como exemplo para responder a esta pergunta, é significativo. Com efeito, os Samaritanos não eram particularmente estimados pelos Hebreus. Além disso, Cristo compara a conduta deste homem àquela de um sacerdote e de um levita, que viram o homem ferido pelos salteadores e deixado meio morto na estrada, e continuaram a sua caminhada sem lhe prestar socorro. Ao contrário o Samaritano, que ao ver o homem sofredor, «encheu-se de piedade» (Lc 10, 33); a sua compaixão levou-o a uma série de acções. Em primeiro lugar ligou-lhe as feridas, depois levou-o para uma estalagem a fim de que cuidassem dele; e, antes de partir, deu ao estalajadeiro o dinheiro necessário para se ocupar do ferido (cf. Lc 10, 34-35). O exemplo é eloquente. O doutor da Lei recebe uma resposta clara à sua pergunta: quem é o meu próximo? O próximo é todo o ser humano, sem excepção. É inútil perguntar sobre a sua nacionalidade, a sua pertença social ou religiosa. Se está em necessidade, é preciso ir ajudá- lo. É isto que pede a primeira e a maior Lei divina, a lei do amor de Deus e do próximo.
Fiel a este mandamento do Senhor, Frederico Ozanam acreditou no amor, no amor que Deus tem por todos os homens. Ele mesmo se sentiu chamado a amar, dando o exemplo de um grande amor de Deus e dos outros. Ia ao encontro de todos os que tinham mais necessidade de ser amados, daqueles a quem Deus-Amor não podia ser efectivamente revelado senão pelo amor duma outra pessoa. Ozanam descobriu nisto a sua vocação, viu o caminho para o qual Cristo o chamava. Encontrou nisto o seu caminho rumo à santidade. E percorreu- o com determinação.
2. «O amor vem de Deus». O amor do homem tem a sua fonte na Lei de Deus; a primeira leitura do Antigo Testamento demonstra-o. Nela encontramos uma descrição pormenorizada dos actos do amor ao próximo. É como que uma preparação bíblica para a parábola do bom Samaritano.
A segunda leitura, tirada da primeira Carta de São João, desenvolve o que significa a palavra «o amor vem de Deus». O Apóstolo escreve aos seus discípulos: «Caríssimos, amemo-nos uns aos outros, porque o amor vem de Deus e todo aquele que ama, nasceu de Deus e conhece-O. Aquele que não ama, não conhece a Deus, porque Deus é amor» (1 Jo 4, 7-8). Esta palavra do Apóstolo constitui verdadeiramente o centro da Revelação, o ápice para o qual nos conduz tudo o que foi escrito nos Evangelhos e nas Cartas apostólicas. São João prossegue: «Nisto consiste o Seu amor: não fomos nós que amámos a Deus, mas foi Ele que nos amou e enviou o Seu Filho como propiciação pelos nossos pecados» (ibid., 10). A remissão dos pecados manifesta o amor que por nós tem o Filho de Deus feito homem. Então, o amor do próximo, o amor do homem, já não é apenas um mandamento. É uma exigência que deriva da experiência vivida do amor de Deus. Eis por que João pode escrever: «Se Deus nos amou assim, também nos devemos amar uns aos outros» (1 Jo 4, 11).
O ensinamento da Carta de João prolonga- se; o Apóstolo escreve: «Ninguém jamais viu a Deus; se nos amarmos uns aos outros, Deus está em nós e o Seu amor é perfeito em nós. Nisto conhecemos que estamos n’Ele e Ele em nós, porquanto nos deu o Seu Espírito» (1 Jo 4, 12-13). O amor é então a fonte do conhecimento. Se, por um lado, o conhecimento é uma condição do amor, por outro, o amor faz aumentar o conhecimento. Se permanecermos no amor, temos a certeza da acção do Espírito Santo que nos faz participar no amor redentor do Filho, que o Pai enviou para a salvação do mundo. Ao reconhecermos Cristo como Filho de Deus, permanecemos n’Ele e, por Ele, permanecemos em Deus. Pelos méritos de Cristo, acreditámos no amor, conhecemos o amor que Deus tem por nós, sabemos que Deus é amor (cf. 1 Jo 4, 16). Este conhecimento mediante o amor é de algum modo o elemento essencial da vida espiritual do cristão. «Quem permanece no amor permanece em Deus e Deus nele» (ibid.).