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quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Circular do Superior Geral-Advento

CONGREGAZIONE DELLA MISSIONE
CURIA GENERALIZIA
A todos os membros da Família Vicentina 
Queridos Irmãos e Irmãs,

             Que a graça e a paz de Nosso Senhor Jesus Cristo estejam em seus corações agora e sempre!
             “Graças à ternura e misericórdia de nosso Deus, que nos vai trazer do alto a visita do Sol nascente, que há de iluminar os que jazem nas trevas e na sombra da morte e dirigir os nossos passos no caminho da paz” (Luc 1, 78-79).
             Trevas e luz, noite e dia, desespero e esperança, morte e vida, inferno e paraíso são imagens, que sempre vêm à mente, em nossa meditação e nossa oração durante o tempo do Advento, o qual temos, mais uma vez, o privilégio de viver. Estas imagens contrastantes estão sempre presentes e não cessam de nos cercar no mundo em que vivemos. Um dia, o profeta Habacuc exclamou: “Por que me mostrais o espetáculo da iniquidade, e contemplais vós mesmo essa desgraça? Só vejo diante de mim opressão e violência, nada mais que discórdias e contendas” (Hab 1, 3). Quando eu ouvi a proclamação deste texto há algumas semanas na Eucaristia dominical, fiquei impressionado por sua atualidade: hoje ainda, estamos cercados pela mesma violência e as mesmas destruições, quer sejam de origem natural ou humana.
             Há tantas vidas humanas destruídas por catástrofes naturais. Penso na epidemia da cólera no Haiti; centenas de pessoas que tinham sobrevivido ao terremoto morreram. Elas continuam sofrendo, não cessam de cruzar um verdadeiro inferno. No Paquistão, centenas de pessoas desapareceram nos ciclones que atingiram recentemente as regiões asiáticas; quantas pessoas perderam a vida, a saúde, sua casa? Entre as catástrofes de origem humana, pensemos na violência vivida na fronteira entre o México e os Estados Unidos onde depois de 2006, mais de 30.000 pessoas foram assassinadas em conflitos ligados à droga. Tanta violência diante de nossos olhos. O Advento é um tempo para transformar o que é trevas em luz, este inferno vivido em paraíso, o desespero em esperança e que uma vida digna pode ser um objetivo realizável.
             Intitulei minha meditação deste ano: “Natal: o relato de uma vida sem fronteiras”. Quando nós percorremos as diferentes passagens da Escritura que a Igreja oferece para a nossa meditação durante este tempo do Advento, encontramos o tema de um Deus que é para todos, um Deus de todas as nações. De certo modo, é irônico porque Jesus, quando nasceu neste mundo, nasceu num recanto, num lugar onde ninguém gostaria de viver, num abrigo para os animais. E, portanto, o contraste vem do fato de que, embora Ele tenha sido colocado neste lugar de sobrevivência, Ele tornou-se para nós, o Deus da vida para todos, o Deus que não conhece fronteiras, um Deus que veio entre nós para derrubar as fronteiras que impedem os homens aproximarem-se uns dos outros, que venham de outro país, como a fronteira entre os Samaritanos e os Judeus, ou porque as pessoas ricas e cultas não se misturam com as que são consideradas como as excluídas da sociedade; Jesus veio derrubar esta fronteira de todos estes intitulados de indesejáveis: leprosos, mendigos, cegos, enfermos.
             Por seu nascimento na pobreza, Jesus, em palavras e em atos, enche a vida das pessoas de riqueza, paz, bondade, saúde, reconciliação e cura, e as conduz das trevas à luz, do desespero à esperança, da morte à uma vida nova. Em agosto passado, tive a oportunidade de visitar o Projeto Juan Diego, um apostolado das Filhas da Caridade situado na fronteira entre os Estados Unidos e o México. Esta visita me falou do dom de uma vida nova, da felicidade de um verdadeiro nascimento que recebemos no Natal. As Filhas da Caridade formaram um grupo de pessoal leigo e de voluntários que compõem uma comunidade dinâmica. Eles visitam as pessoas que viveram nas trevas, que experimentaram as angústias da desesperança e lhes oferecem luz e a esperança em uma vida nova. Eu, pessoalmente, vivi isto quando visitei algumas pessoas que tiveram suas vidas transformadas pelo Projeto Juan Diego. São pessoas acompanhadas pelos voluntários, funcionários e Irmãs que entraram em suas vidas e que lhes deram a oportunidade de viver uma vida nova.
             Percebi isto através do testemunho de um homem da minha idade, que estava literalmente, desligado do mundo, vivendo confinado em seu pequeno quarto, recusando mesmo sair em seu pátio, para entrar em contato com as outras pessoas, que poderiam passar perto dele. Após um acompanhamento e uma presença cheia de doçura, mas também, de firmeza, este homem acabou descobrindo quem ele era realmente. Depois de ter tido a felicidade de viver pela primeira vez de sua vida, doravante, ele vive com entusiasmo e o desejo de sair dos confins de sua casa, para encontrar-se com os outros e encorajá-los a levar a vida de uma nova maneira, que ele mesmo descobriu. O testemunho deste homem é somente um exemplo, dos numerosos relatos de pessoas que receberam uma vida nova, a partir do momento em que foram capazes de superar os limites, que elas se impuseram. Elas acabaram reconhecendo o dom da vida que é Deus para cada um de nós e para todos os homens. Este dom foi depositado em nós e faz parte integrante do significado do Natal: o dom do próprio Deus, Jesus encarnado que entra em nossa vida, ajudando-nos a descobrir nossos próprios dons, encorajando-nos e levando-nos a nos superar para oferecer este dom, a fim de ajudar outros a descobri-lo neles mesmos.
             Próximo deste bairro onde as Filhas da Caridade são um sinal de vida nova e partilham esta vida com outros, há um outro grupo de Filhas da Caridade que é fonte de vida, mas de uma maneira muito diferente. Poderia-se dizer que elas vivem o inferno. Esta comunidade de Filhas da Caridade mora justamente do outro lado da fronteira em uma cidade que é devastada pela violência e a destruição por causa da droga, a pobreza, a ganância e a ignorância. As Irmãs passaram a fronteira para se unirem às Filhas da Caridade do Projeto Juan Diego, logo após celebrarmos juntos a Eucaristia, que é o ápice de nossa vida, a fonte de nossa força e a verdadeira experiência do dom que Deus faz de Si mesmo entre nós.
             Falando com as Irmãs que vivem do lado da fronteira mexicana, escutando os seus relatos de horror e sofrimentos quotidianos, em meio aos quais elas vivem, fiquei impressionado pelo contraste da presença das Irmãs que vivem de um lado da fronteira comparado ao das Irmãs que vivem do outro. E, contudo, mesmo se pudéssemos considerar uma como o paraíso e outra como o inferno, a presença delas, sinal da graça de Deus entre estes pobres, torna possível uma esperança e uma vida nova.
             Através destas duas experiências percebo, claramente, o que Deus nos diz no cântico de Zacarias: “Graças à ternura e misericórdia de nosso Deus, que nos vai trazer do alto a visita do Sol nascente, que há de iluminar os que jazem nas trevas e na sombra da morte e dirigir os nossos passos no caminho da paz” (Luc 1, 78-79). Esta ternura, este amor do coração de nosso Deus é o dom do próprio Jesus, do alto o sol nascente nos veio visitar, este dom de Jesus através de seu nascimento em Belém, que por sua vida, sua morte e ressurreição continua brilhando sobre aqueles que permanecem nas trevas, no desespero, na morte e no inferno. E por Seus instrumentos de amor, eles são conduzidos pelo caminho da paz.
             Meus Irmãos e Irmãs, como membros da Família Vicentina, neste tempo do Advento, somos chamados a estar próximos daqueles a quem chamamos nossos Senhores e Mestres, quando estes vivem em situações de trevas e angústia, e ser para eles, instrumentos de esperança e vida. Juntos, como Família Vicentina, e com nossos Senhores e Mestres, somos chamados a ser construtores, construtores da solidariedade que tem como alicerce o amor, e não construtores de muros, que separam a humanidade. Somos chamados a viver a vida de Jesus, esta vida que veio a nós no dia em que Ele nasceu. Ele nos convida a ir além dos muros, além dos limites, das fronteiras, aquelas que tão frequentemente nós mesmos construímos, ou as que foram construídas pela sociedade na qual vivemos. Muitas vezes, trata-se de tradições que nós aprendemos ou de preconceitos que, simplesmente, adotamos.
             Gostaria de partilhar com vocês, uma oração que eu encontrei numa celebração preparada pela Comissão da União dos Superiores Maiores para a Justiça, a Paz e a Integridade da Criação, a fim de celebrar o dia internacional da recusa da miséria e a eliminação da pobreza. Esta oração, intitulada As bem-aventuranças para a Ação Social, foi adaptada à nossa realidade como Família Vicentina.

  • Bem-aventurados sois vós, quando permaneceis disponíveis, partilhando com simplicidade o que possuis. 
  • Bem-aventurados sois vós, quando chorais pela falta de felicidade ao vosso redor e no mundo. 
  • Bem-aventurados sois vós, quando optais pela doçura e pelo diálogo, ainda que isso pareça longo e difícil. 
  • Bem-aventurados sois vós, quando criativamente inventais ideias novas, formas de doar vosso tempo, partilhar vossa ternura e semear a esperança. 
  • Bem-aventurados sois vós, quando sabeis escutar com o coração para descobrir o presente que são os outros.
  • Bem-aventurados sois vós, quando experimentais dar o primeiro passo necessário para construirdes a paz com os irmãos e irmãs através do mundo. 
  • Bem-aventurados sois vós, quando conservais o coração aberto ao encantamento, à acolhida e ao questionamento da vida. 
  • Bem-aventurados sois vós, quando tomais a sério a fé no Cristo encarnado.
             Ao longo deste tempo do Advento, peço-lhes meditar esta oração, individualmente e com as pessoas, com as quais partilham a vida. Em nossa vida, temos numerosas experiências de uma vida sem fronteiras. São experiências do relato de Natal, experiências da presença de Jesus entre nós. Que o nosso próprio testemunho no mundo seja um sinal que ajude as pessoas a saírem da noite e a virem ao dia, a se distanciarem de suas trevas para entrarem numa luz nova, a erguê-los do desespero e a plenificá-los de esperança, a fazê-los passar da morte para uma vida nova, a tirá-los do inferno, para conduzi-los ao paraíso. Podemos fazer isto acontecer se nós vivermos verdadeiramente o dom de Cristo encarnado, o dom de Sua vida, o de Seu amor e o dom de Sua paz. Podemos agir assim, não só com as pessoas que nos são próximas, mas também, com aquelas que estão distantes e não podemos reunirmo-nos a elas.


Seu irmão em São Vicente,

G. Gregory Gay, C.M.
Superior geral
  

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